The Red Bicycle by Henry Gordon
Sonhei com um Conto
Mas foi breve como Haikai
Foi-se o canto
Tanto, tanto, tanto
Ficou o encanto
No canto
Franzino em meio ao pranto
Vidas escorrem
Mas certo é o ponto.
(…) “foi algo passageiro, superficial.”
The Red Bicycle by Henry Gordon
Sonhei com um Conto
Mas foi breve como Haikai
Foi-se o canto
Tanto, tanto, tanto
Ficou o encanto
No canto
Franzino em meio ao pranto
Vidas escorrem
Mas certo é o ponto.
(…) “foi algo passageiro, superficial.”
Eu já gostei muito dessa música, bem verdade. A letra, melodia e toda a semântica dessa composição me encantaram por quase duas décadas. Hoje, norteada por outros princípios, ela já não me apraz como um dia fez. Mas é verdade que a ideia de um amor que não pôde ser vivido possa ser aproveitado algum dia por outro casal, mesmo depois de milênios, me pareça criativa.Foi essa a explicação que o compositor Chico Buarque deu quando perguntado de onde saiu a inspiração para a canção Futuros Amantes:
“Eu tava mexendo no violão, começando a fazer a melodia, e a primeira imagem que apareceu foi exatamente esta: uma cidade submersa, isolada de tudo. Porque, cantarolando, parecia que a música queria dizer isso. Eu tinha que ir atrás da explicação dessa cidade submersa. Aí eu coloquei os escafandristas, e surgiu a história de um amor adiado, um amor que fica para sempre. Essa idéia do amor como algo que pode ser aproveitado mais tarde, que não se desperdiça. Passa-se o tempo, passam-se milênios, e aquele amor ficará até debaixo d’água. Um amor que vai ser usado por outras pessoas, um amor que não foi utilizado porque não foi correspondido, e então ele fica ímpar, pairando… Esperando que alguém o apanhe e complete a sua função de amor.”
Eis: 🎵
Futuros Amantes
Chico Buarque
Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios no ar
E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você
Faz algum tempo que cheguei
Tanto que passou
que passei
Tanto pensei
Corri contra o tempo
E entre um ponteiro e outro
perdi
caí
sorri
penei
ganhei
me ergui
Há algum tempo, o tempo passou por mim
Me contou coisas
Desvendou outras
Me ensinou muitas
Desaprendi tantas
Há tempo que cheguei
Por muito, estive
parti
Já não estou
O tempo moldou
Pouco restou
Quase tudo mudou
morri
E somente agora
eu sou.
Obrigada Jesus!
Ps. Um “clic” do homem que me amava ontem e me ama hoje.
O pescador acorda antes do sol e, com o corpo cansado e alma disposta, apanha seu saco de pescaria e segue para o caminho do mar. Com passos firmes e despretensiosos, assiste ao céu anunciar a transição das estrelas para os primeiros raios da manhã.
E então, uma aquarela surge em meio ao nevoeiro matinal: tons de lilás começam a escorrer no azul noturno e, de repente, rabiscos rosados vão cortando o horizonte. Um cenário cheio de imagens que só Caymmi sabe cantar.
Depois de muito caminhar, ele chega em seu lugar sagrado. Ouve gaivotas e a dança da corrente marinha ba
ten
do nas pedras.
Escuta grilos e vento derrubando folhas.
Há cheiro de maresia se entrosando com algumas ervas daninhas.
Há cantos de bem-🎼 te- vis e papa-🎼capins.
Gaivotas desfilando sob o mar.
Encantos de sereias ecoando na maré cheia.
Um verdadeiro ensaio orquestral.
Mas o que ouve o pescador além das vozes que o cerca?
Atento, lança sua vara ao mar.
Paciente, ele espera.
Entre suspiros e arremessos, há pausas silenciosas daquelas que pertencem somente aos que se dedicam a arte de saber esperar.
Mas há também barulhos internos e alguns monólogos que, quem sabe, o mar compreenda.
O objetivo é o peixe ou a pescaria?
De repente, ele vê um borbulho na superfície espelhada n’água, a vara começa a inclinar, o olhar está atento e as mãos ágeis estão prontas para o primeiro fisgar da manhã.
O que agarrou o seu anzol?
O pescador posiciona o corpo e manobra a vara com rapidez. Algo parece ter fisgado a sua isca. Uma luta se inicia. Ele inclina o corpo para trás e o que quer que tenha agarrado o seu anzol, reluta. Quem sabe o maior de todos os peixes que ele tenha pescado. Talvez seja essa a maior vaidade do pescador: pescar o maior ou ainda, o mais raro peixe do oceano.
A luta sessa e, cuidadosamente, ele se aproxima da superfície. Lentamente, a maré se acalma e o pescador olha fixamente para o mar e se depara com algo grandioso:
A própria imagem refletida na superfície da água parada.
O sal do mar é o mesmo que escorre em seu rosto, pescador?
Qual bússola te guia quando perdes a noção de espaço?
Para onde o seu olhar cansado caminha quando os céus já não te explicam os mistérios do tempo?
Em que porto você ancora a sua alma ao final de cada dia?
Uma criatura cintilante de cauda gigantesca avermelhada e nadadeiras de cor púrpura, salta sob os olhos do pescador rasgando o mar entre os raios de sol. Então, a sua imagem espelhada se fragmenta entre a maré. Surpreso, ele começa a vislumbrar o show diante de seus olhos:
Uma espécie rara saltando de dentro de sua alma.
Na moringa, leva pra casa o resultado de sua pescaria: perguntas, recordações, sonhos, um tanto de dores, amores naufragados, a inalcançável busca do homem pelo menino e uma certeza:
o gosto da vida não está nos resultados mas na preparação.
(Junho, 2022)
Dedico ao meu amigo Matheus. O único pescador que conheço.
Recuso-me a participar de debates frívolos e mesquinhos de gente que se intitula intelectualizada e que vejo, nas ações, vivem em suas bolhas gritando por uma democracia cuja régua alcança somente o que lhes convém. Recuso-me fazer parte de picuinhas vazias de ideias e cheinhas de adjetivos depreciativos onde, grande parte de quem os profere, sequer conhece a história do que acusam quem dirá o significado do que estão falando, pior, repetindo.
Não é sobre políticos, é sobre ideias. É sobre nossa ética, sobre o que realmente norteia nossa moral e valores. É sobre sermos mais honestos com nós mesmos, sobre sermos menos vaidosos e admitirmos o nosso cinismo. E aí, podemos começar a enxergar com nossos próprios olhos e não sob as lentes do alheio, quem realmente está interessado em representar as nossas ideias.
É fácil atacar quem pensa diferente, mas raramente esses conseguem usar do seu tempo para fazer algo verdadeiramente produtivo. O começo é sempre dentro. A mudança começa sempre numa escala menor.
Enquanto tivermos políticos de estimação, enquanto estivermos somente atacando ou somente defendendo pessoas ao invés de estarmos colocando nossas ideias em prática como prioridade, enquanto estivermos olhando o diferente como se tudo soubéssemos sobre ele, seremos nós os adestrados, seremos nós os governados ao invés de governantes.