quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Georgós

 



Eu não consigo lembrar de você sem o seu violão, o seu sorriso com ares tímido (mas grandão) e a voz que aplacava o coração de quem te ouvia cantar. 


Como volto agora para o nosso bairro sabendo que não terei a menor chance de ter  o nosso encontro quase telepático       debaixo do pé de tamarindo? Eu quase posso escutar as suas gargalhadas misturadas às nossas teorias inventadas: eu tentando renomear o nome dos planetas e você, reagrupar a tabela periódica. Eu criando rimas e você, algumas estrofes. Eu tentando recitar Florbela Espanca e você, adicionando Tim Maia pelo meio. Eu te contando sobre como eu odiava Latim e você, cantarolando qualquer coisa de Julio Iglesias só para me irritar. (e eu amava) 


Como vou olhar para qualquer  árvore frondosa em noite de lua brilhante e céu bem estrelado e não recordar essa voz tão, tão sua? Eu queria tanto ter te apresentado à minha família… tanto! Íamos formar um soneto de gargalhadas.


“Lu, Lu… minha amiga Lu. Vai dormir, menina.” Você dizia toda vez que passava e lá íamos tagarelar, feito duas matracas, coisas que ninguém entendia. Eu estava doida para te contar que aprendi a dormir cedo e acordar com as galinhas. Tantos anos se passaram, tanto aconteceu… 


Parece até ironia, ainda  hoje imaginei você cantando em um luau que sonho há anos. Você sempre esteve nele em minha cabeça e, às vezes, me perguntava se você iria aceitar ao meu convite. Já não importa, o luau será cancelado, ele não teria a menor graça sem você. Nenhuma! 


Estou desde a notícia de sua partida meio muda, desprovida de qualquer reação, tão contrário  às lembranças que tinha de mim quando te encontrava. Não fomos amigos de longas datas, bem verdade. Mas o pouco de você se agiganta em qualquer pessoa que teve a alegria de te conhecer, tenho certeza disso. Você é uma recordação (persistente) bem singular de minha juventude e eu devo agradecer muito a Deus por ter me presenteado esbarrar em você no meio de tanta, tanta gente. (você diria, 8 bilhões de pessoas. Eu retrucaria com uma teoria maluca qualquer e riríamos juntos pela derradeira vez). 

Ah, Jorge… 
Já estou aqui imaginando você tocando o seu violão espacial tão bonito quanto o seu sorriso, batendo altos papos com Jesus e enCANTANDO para o nosso Criador. 

Com afinco e afeto, (como você me escrevia)

Lu 


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