(Dedicado a William Silveira Castro e Antonia Carlin)
Tinha dias que ela ia me ver. Não avisava, chegava como se caminhasse na ponta dos pés.
Me encontrava em qualquer canto da casa e, sem dizer uma palavra, me beijava.
Um daqueles que engole a alma da gente. Daqueles que diz sem nada dizer. Um beijo.
Me beijava atrás da porta, do armário e da estante de livros.
Dentro do banheiro, nos corredores vazios e nos elevadores.
Escondidinho, me beijava.
Às vezes ela telefonava para perguntar sobre como foi o meu dia e outras para dizer como foi o dela. Quando o assunto terminava, até o silêncio era bom. Sobrava o riso.
Era uma otima ouvinte e oradora. Dona de uma fala que fazia pensar e escuta que confortava. Atenciosa e divertida, cuidadosa com ela e com quem estava ao redor. Dedicada em tudo que se voluntariava, até nas obrigações mais chatas. Autêntica e sedutora. Tudo junto. Toda ela.
Era ela.
De vez em quando me levava ao cinema. No caminho, parava para me beijar em frente ao cemitério. Fazia convite para almoçarmos juntos, preparava uma comida que eu nunca disse que adorava. Movia a TV da sala para o quarto somente para ver filmes com as pernas agarradas às minhas.
Cheia de tatos e manhas.
Tinha dias que me acordava para dizer que estava encantada e acho que nem sabia que quem de fato estava era eu.
A fome que sentia era parte do feitiço. Uma gulodice gostosa e sem pecados.
Essa mulher me comia na estrada, no banheiro feminino, no chão do ap, no sofá da sala, na cama e no carro. E ainda me chamava de 'doido'... veja! Ela me amava com a força do sentimento de quem externa toda tristeza e beleza do mundo. Um amor cheio e pulsante.
Inteiro.
Às vezes eu ficava bisbilhotando como ela dormia. Toda largada na cama, parecia que estava aprendendo voar. O corpo cheirava amêndoa doce e a mão ficava quase sempre estendida sob o peito. Peito cheio de vida e de ideias criativas. Pleno de disposição e vontades.
Cheio de tudo!
Tinha dias... não, não! Todos os dias, ela vinha com uma graça. Uma piada, uma sacada do trecho de um livro, de um filme, de uma tirinha. Todo dia uma gargalhada provocada. Riamos juntos. Eu ficava com cara de bobo, pensando como alguém tão extrovertida cheirava tanto à timidez superada. Cheiro que a tornava ainda mais interessante.
De vez em quando me emprestava dinheiro, deixava bilhetinhos em alemão em meus livros, fazia versos, ensaiava musica no violão, penteava meus cabelos com a ponta dos dedos, via peça de teatro sozinha, ficava chateada quando eu ria sozinho sem compartilhar a graça, entrava de surpresa no chuveiro, me amava e, de muitos jeitos, me mandava para o inferno.
Eu ia. Todo feliz.
Essa mulher que tanto eu seduzi, que tanto me seduziu, que tanto me quis e eu quis igualzinho.
Essa mulher morta ainda vive em mim.
Como se fosse ontem.
2 comentários:
Que texto lindoooooo
Nossa o final entao, essa mulher tbm um dia existiu em mim. Mas, que agora anda adormecida.
Nossa estou ate sem palavras.
Saudades dos seus emails =)
Oi, sua linda! Qto tempo!
Menina, eu leio suas postagens e quando vou deixar comentario aparece uma mensagem solicitando um perfil. Como e' isso, me explica?
Eu te enviei um e-mail faz algum tempo, na sei se voce recebeu. Quando quiser trocar ideias, me adiciona no MSN luzletras@hotmail.com
Gosto muito de seus desabafos no blogue.
Super beijo e obrigada.
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