sexta-feira, 23 de março de 2012

Arapuca ou Quando queremos nos expressar e nem palavra traduz


Ele aparecia sempre de manhãzinha e pousava macio-macio no arbusto molhado. Exibido que só ele, danava a cantar e ouriçar a penugem acobreada enquanto eu, da janela, coava o café.
O bicho cantava com uma boniteza espantosa e com ele, toda uma orquestra: besouros, gaivotas, sapos e grilos.
Era um papa-capim e eu o queria! Queria prendê-lo. Prender  para sempre aquele canto  fugaz em mim, tão exposto ao nunca-mais...
Um dia, decidi armar uma arapuca. Com muito cuidado, preparei a caixa. Talisca por talisca. Barbante bem apertado, o fecho da porta o máximo flexível ao ponto que qualquer trisquin e ele já estaria ali, preso, cantando à minha disposição. Para sempre.
Acordei no cochichar do dia, coloquei o grão dentro da arapuca e, ansiosa, corri pra perto da roseira. Voltei o olhar em direção das laranjeiras e lá vinha ele desfilando suave em plena neblina leitosa para me regalar aquele canto de mundos desconhecidos.
Deslizando pelo cardeal Norte, diminuiu a velocidade e quando já ia pousar, um vento soprou a arapuca e, de um só golpe, a fruta ele roubou.
Tadinha de mim! Sonhei possuí-lo e ele voou.
O papa-capim fugiu levando o doce da fruta.
Igualzinho a Palavra.

Um comentário:

Ana Carla Benet disse...

Adorei sua visita e seu comentário!!!!
Vou curiar seu blog todo agora mesmo... rsrsrsrs

Bjo